Curiosidade!
Pelas estradas do Paraíso
Perdido
Ali, parado, imóvel de tudo, nem
respirando direito, observava. Foram uns tantos minutos; talvez
uns 04 ou 05; parecia que foram horas. Vi quando ele se esgueirou
por dentre a vegetação densa e se embrenhou no cerrado. Estava só.
Observei ainda que ele se preocupava em não fazer alarde.
Esgueirava-se por entre os galhos, levantava bem as pernas e as
descia lenta e certeiramente, pisando onde não faria ruído, tanto
quanto enfiava os braços por dentre as galhadas, quase que nadando
por entre as folhas. Engraçado, pensava eu, todas as semanas
destes últimos meses esse indivíduo vinha ali. Entrava quase que
pelo mesmo lugar; nas redondezas. Sempre às quintas-feiras e
invariavelmente entre as 05:30h e 06:30h horas da tarde. Fica lá
por uns 15 a 20 minutos; sempre! A curiosidade é um sentimento
muito estranho mesmo. O medo também. Sentia meu coração super
acelerado mesmo quando imaginando entrar ali para ver o que
existia de tão interessante para aquele cara ir tanto lá. Tinha
que saber o que existia. Tinha que saber. O que será? Se ele
sempre entra só e sai só, entra vestido e sai com o paletó no
braço, o que estaria fazendo lá no meio do mato? E tem mais, lá
bem para dentro, pois por inúmeras vezes ouvi o farfalhar das
folhas mato afora.
Aquela estrada era de pouco
movimento; não muito pouco, pois, com o passar dos anos vieram as
pessoas de bairros que foram se anexando aos então já existentes,
e com isso, se achegando mais às nossas bandas. Ela descia calma
por uns 100 metros, virava-se à esquerda e descia-se novamente
mais uns 100 metros, aí mais ligeira,
virava-se à direita e andava-se no plano, quase um vagar
tranqüilo, com pequena curva para a esquerda, por uns 200 metros.
Nesse percurso todo, alguns poucos entroncamentos que nada nos
diziam e mais uns 100 metros à frente, uns 200 descendo em curva
direita-esquerda com 02 entroncamentos um da “Chacrinha“ beirando
a cerca e outro do “ Morro Vermelho “ e aí , finalmente um
entroncamento mais aberto. À direita ia lá para o Sítio do “Seu
Doutor“ e na reta, descendo até outro entroncamento, mais ou menos
50 metros, novo entroncamento, sendo à esquerda desciam-se para o
pessoal dos Fortes e à direita para a tal Chácara do Tanque,
infestada de esquistossomose. Nadei muito lá. Ferrei-me. Dane-se;
foi bom quando nadava. Mas era ali, próximo à estrada que ia para
o Sítio do Seu Doutor que a coisa ocorria. Dali se tem coisas
engraçadas. Outras tristes e outras misteriosas; êta lugarzinho
cheio de coisas, cheias de lembranças; não, sou eu quem tem as
lembranças. É isso. Ali foi palco de muitos acontecimentos; uns
muito tristes mesmo. Deixa pra lá!
Mas então; foi ali. Descendo para
a “cidade“ como dizíamos quando saíamos de casa rumo ao centro da
cidade ou para outro local na “rua“, à direita era o tal recanto
onde o camarada invariavelmente fazia suas entradas no cerradinho.
Um belo dia imaginei: - esse
indivíduo anda bem uns 10 ou 15 metros mato adentro; será que
andaria mais e eu não estaria escutando os barulhos , que já eram
poucos pelos cuidados que ele tinha? É, pode ser que sim e pode
ser que não. Apurei os ouvidos. De longe, bem de longe ouviam-se
vozes; que estranho, pensei! Está tudo tão longe das casas dos
Fortes, seriam lenheiras? Catadores de esterco? Quem sabe seriam
dos donos de cavalos que por ali pastavam? Ouvia-se também alguns
ruídos e gemidos estranhos. Coragem eu não tinha para ir lá; isto
eu não tinha mesmo! O que seriam esses gemidos? De hipóteses em
hipóteses fui ajuntando idéias, amontoando pressupostos...
conjecturando... - ÔI MENINO! – Um vozeirão acordou-me dos
pensamentos e por pouco não caí ao chão. – Era o tinhoso; era o
maldito do homem que vasculhava aqueles matos; era o cão dos
infernos que voltara lá de dentro do cerrado e me flagara ali,
absorto em meus pensamentos, imaginando e imaginando sobre o que
seria que o levava ali. – E AÍ MENINO ? – PERDEU A LÍNGUA? -
ASSUSTOU-SE ? – “CÊ TÁ BRANCO, INFELIZ ! “ – Não consegui
responder; as palavras não me saiam da boca. – DIZ ALGUMA COISA AÍ
SEU PRAGUINHA! – O QUE ESTÁ FAZENDO AÍ OLHANDO PRA MINHA CARA? –
Moço, balbuciei trêmulo, eu sempre vejo o senhor entrar aí e então
estava me perguntando o que é que o sr. faz aí toda vez que entra
no cerrado... – SÓ ISSO? – JÁ “TE ARRESPONDO”! – EU ENTRO PARA
FAZER LÁ DENTRO DO MATO O QUE VOCÊ ACABOU DE FAZER AÍ NAS CALÇAS
!
Ele saiu rindo e eu, bem
lambuzado, fiquei com aquela cara de titica...
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